sexta-feira, 7 de novembro de 2014

Reflexões sobre o Mês da Consciência Negra (2014)

Reflexões sobre o Mês da Consciência Negra
Por José Benedito e Barros


1. O que significa “consciência negra”?
Consciência: com conhecimento.
Negra: povo e comunidade negra/afro-brasileira, incluindo todos aqueles que se sentem pertencentes ao povo negro/afro-brasileiro, as comunidades tradicionais civis ou religiosas, os movimentos negros, dentre outros.

2. Por quê um mês dedicado à consciência negra? Por quê em novembro?
O processo de tomada de consciência é contínuo e ocorre, portanto, durante todo o ano. No mês de novembro, apoiados na luta dos quilombolas no Brasil, da qual Zumbi dos Palmares e Dandara são referências, intensificamos as atividades. Novembro é, para a comunidade negra e afro-brasileira o fim e o início de um ano de trabalho de luta pela igualdade social e pelo respeito às identidades e alteridades do povo brasileiro.
3. Como será o mês da consciência negra em Limeira?
O mês da consciência negra 2014 em Limeira consistirá na divulgação de informações e conhecimentos e, ao mesmo tempo, na provocação de reflexões e debates sobre a história, sobre a cultura, sobre a realidade, necessidades, sonhos, projetos e políticas públicas de interesse da população negra e afro-brasileira.
Serão abordados aspectos como economia (trabalho e renda), cultura (música, dança, teatro, literatura, artes plásticas, religião), e cidadania (direitos fundamentais, políticas públicas de igualdade, liberdade e solidariedade).
Serão apresentados ao Poder Público sugestões e propostas de políticas públicas voltadas para as necessidades e interesses da comunidade negra e afro-brasileira.
4. Qual é realidade social do Brasil?
O Brasil é um país marcado profundamente pela desigualdade social e pela pobreza. m um relatório da ONU (Organização das Nações Unidas), que foi divulgado em julho de 2010, o Brasil aparece com o terceiro pior índice de desigualdade no mundo e, em se tratando da diferença e distanciamento entre ricos e pobres, fica atrás no ranking apenas de países muito menores e menos ricos, como Haiti, Madagascar, Camarões, Tailândia e África do Sul (1).
O índice Gini, que mede a desigualdade de renda, divulgou em 2009 que a do Brasil caiu de 0,58 para 0,52 (quanto mais próximo de 1, maior a desigualdade), porém esta ainda é gritante (2). Esses dados indicam uma pequena melhora, mostrando também que há um longo caminho a ser percorrido para que tenhamos um país mais justo.
Apresentado como um dos casos mundiais de sucesso na redução da fome, o Brasil, no entanto, ainda tem mais de 16 milhões de pessoas vivendo na pobreza: 8,4% da população brasileira vive com menos de US$ 2 por dia. O Brasil conseguiu reduzir o número de pessoas que vivem com menos de US$ 1 ao dia - em 75% entre 2001 e 2012. Essa redução é resultado de políticas públicas que atacaram diretamente a miséria neste país (3).
5. Como a realidade social brasileira atinge os grupos identitários, como os negros e afro-brasileiros?
A desigualdade atinge os segmentos sociais de forma diversa. Questões de raça e etnia, de religião, de gênero, dentre outras interagem com a desigualdade social, resultando assimetrias entre os grupos. Assim, as mulheres sofrem mais impacto social que o homem; os negros e índios, mais que os brancos; os de religiões de matriz cultural afro-brasileira, mais que as religiões de outras matrizes culturais.
No caso dos negros (51% da população, segundo o IBGE-2010), a título de ilustração, pode ser citado o artigo de Fábio Amato (4).

A Relação Anual de Informações Sociais (RAIS) de 2010, divulgada nesta quarta-feira (11) pelo Ministério do Trabalho, aponta redução na diferença entre a remuneração média paga a brancos e negros no Brasil. Entretanto, ela continua alta e fechou 2010 em 46,4%. Em 2009 esse índice era de 47,98%.
De acordo com o Ministério do Trabalho, a redução se deve ao reajuste real médio (acima da inflação) concedido no ano passado. Trabalhadores brancos tiveram aumento de 2,47%, ante 3,58% dado aos negros e 3,05% aos que se declararam como pardos.
A RAIS identificou que a maior disparidade salarial entre negros e brancos ocorre na faixa de trabalhadores com nível superior completo. Neste nicho, o rendimento dos negros representa 69,83% do dos brancos.
Profissionais identificadas como mulheres e negras receberam em 2010 o menor salário médio no Brasil: R$ 944,53, ante R$ 916,30 em 2009. A remuneração média das mulheres pardas foi de R$ 1.001,52 no ano passado e, das brancas, R$ 1.403,67.
Já a média salarial dos homens em 2010 ficou em R$ 1.891,64 (brancos), R$ 1.296,39 (pardos) e R$ 1.255,72 (negros). Os dados por raça e cor referem-se apenas a trabalhadores da iniciativa privada, um universo de 35,5 milhões de pessoas.

Os dados acima são exemplificativos. Dados similares podem mostrar a mesma lógica na cultura, na educação e na representação política.

6. Quais são as causas da desigualdade?
Os dados que mostram a desigualdade devem aguçar nossa reflexão: se o Brasil está entre os país mais ricos, por que tanta desigualdade? Por que tanta miséria? Quais são as causas de tanta disparidade?
Alguns culpam a cultura do povo brasileiro e, em particular, dos mais pobres; outros, na falta de consciência política; outros, na falta de crescimento econômico; outros, ainda, nas catástrofes naturais e crises econômico-sociais(chuva demais, seca, inflação, conflitos nacionais e internacionais, conflitos étnicos, queda das bolsas de valores, etc.).
Entretanto, as verdadeiras causas precisam ser detectadas. O Brasil é um país com uma tradição histórica hierárquica: monárquica, patriarcal, escravista e capitalista. Socialmente, isso se traduz por: concentração de poder, de riqueza, de cultura; preconceito e discriminação de gênero, de etnia, de cultura, de religião, dentre outras.
No processo histórico brasileiro, a visão de sociedade hierárquica tem procurado sufocar as visões comunitárias das comunidades populares, a saber, dos índios, dos afro-brasileiros quilombolas, dos trabalhadores do campo e da cidade, dentre outras. Isso significa que vive-se no Brasil uma opressão radical, de tal forma que, os que de fato, produzem as condições de existência, os trabalhadores, vivem à margem dessas condições. À rebelião daqueles que estão na base da hierarquia, da pirâmide, o sistema, responde com a criminalização e a repressão.
Assim, as verdadeiras causas podem estar na lógica do modo vigente de produção da existência, que é capitalista, mas com características herdadas historicamente, a saber, monárquicas, patriarcais, escravistas e, em decorrência disso, explorador, preconceituoso, discriminatório e violento.
7. O que falta para que tenhamos igualdade social e paridade étnico-racial?
As pesquisas e levantamentos de dados mostram que na última década houve diminuição das desigualdades sociais. Essa diminuição foi mais acentuada entre os negros e negras. Isso é resultado de políticas públicas de reparação e compensatórias como cotas sociais e étnicas, bolsa-família, Plano Nacional de Igualdade Racial, dentre outras.
Mas é preciso avançar mais. É preciso combinar a luta por mudança estrutural, pela igualdade social de cunho universalista, de desmonte da lógica de dominação e opressão, priorizando aqueles que mais sofrem os impactos da dominação que, no caso em análise, são os negros. Essa luta não é só dos negros. Outros grupos também sofrem impactos negativos que precisam ser observados. Mulheres, praticantes de religiões de matriz cultural afro-brasileira, ciganos, indígenas, dentre outros são constantemente vítimas de violência concreta ou simbólica e requerem políticas públicas específicas também.
Tanto as lutas gerais quanto as lutas específicas necessitam de planos articulados com um projeto emancipatório comum, significando que alianças são necessárias e devem ser construídas a partir das necessidades e objetivos comuns, respeitando-se as especificidades de cada grupo.
8. Referências
1. http://desigualdade-social.info/desigualdade-social-no-brasil.html
2. http://www.brasilescola.com/sociologia/classes-sociais.htm
3. http://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/agencia-estado/2014/09/16/brasil-reduz-a-pobreza-extrema-em-75-diz-fao.htm
4. http://g1.globo.com/economia/noticia/2011/05/diferenca-do-salario-entre-brancos-e-negros-cai-mas-ainda-e-de-464.html

Contato:
José Benedito de Barros é Mestre em Educação, Especialista e Bacharel em Direito e Licenciado em Filosofia
Email: jbenebarros@yahoo.com.br
Blog: www.profjosebenedito.blogspot.com.br